sábado, 6 de novembro de 2010

E se o amor quiser provas




Manhã de domingo, ela olhou preguiçosamente para lado e não havia mais ninguém na cama. Apenas seu corpo pesado ocupava o espaço. Pensou em se levantar, mas os olhos remelavam tanto que preferiu adiar o momento até quando a dor chegasse a seu corpo e ela não pudesse mais conter. Duas horas depois, decidiu que: ou era dissolvida, ou se levantava. Sabendo que tudo é solúvel, percebeu que escorreria para algum lugar sombrio. Ficou com a segunda opção. Calçou seus chinelos se espreguiçando, lavou o rosto, abriu a porta e logo avistou seu companheiro. Ali estava ele, com toda sua plenitude... esperava-a com um café quente e torradas. O cheiro percorria todo o apartamento. Ela sorriu, como se o vapor fosse música. Talvez fosse, talvez o amor tivesse composto algo, instantaneamente quente, em seu coração.


Então, depois do café da manhã, o casal se beijou e foi a igreja. Chegaram às 11:00 e como de costume, ela fez o almoço enquanto ele assistiu aos seus programas desportivos. Era sempre a mesma coisa... Almoçavam, viam o jogo e logo depois algum filme, até que dormissem pelo sofá. Depois iam para a cama assustados com a velocidade com qual o dia foi embora, preparando seus corpos para o cansaço de mais uma semana de trabalho, acostumando suas mentes para o amor retraído, estressado, quase mal educado, que os esperava durante a semana.


As vezes, o domingo se tornava tão distante que eles se esqueciam de todos os bons pensamentos e se entregavam ao caos do dia-a-dia. Ele deixava de lado as cores que pintava os olhos dela quando, de repente, eles saltitavam ouvindo aquela música. E ela ignorava o brilho do sorriso dele quando ele ajudava alguém. E então, eles brigavam. E aquela era sempre a última vez, tudo ou nada. Sempre quase acabava, para refazer o quase início. A verdade é que sabiam que os laços que os uniam não podiam se romper, mesmo que esquecessem da sua existência. Mas o coração sempre reconhece o que o fez mais livre, porque o amor de verdade liberta, não prende.


Anos se passaram, até que um domingo ela olhou para o lado de sua cama e, novamente, não viu ninguém. Mas dessa vez não ficaria deitada, não havia sono. Somente um grande vazio preenchia seu corpo e seu espaço. Levantou logo e saiu com os pés descalços no chão frio de seu apartamento, olhou e não encontrou ninguém a sua espera. Não havia café nem torradas, só um chá gelado na geladeira. Foi o que bebeu naquela manhã, sentada no sofá enquanto Renato Russo cantava, na velha vitrola, que " é tão estranho, os bons morrem jovens...". Então ela ficou ali, sentindo o coração apertar cada vez mais, a garganta contraindo... Não tinha pra onde ir, nem o que fazer, estava imóvel, olhos fixos no nada.

Depois de terríveis duas horas, a mulher se levantou e foi até o quarto. Abriu o guarda-roupa, olhou, olhou... não tinha nada dele. Correu até o banheiro, só havia uma escova de dentes. Ela se olhou no espelho e não viu nada, chorou, puxou seus cabelos, quebrou alguns enfeites. Tentava se lembrar de como aquilo teria ocorrido, ela se sentia presa em um poço escuro e não sabia como escalar de volta a superfície. Agora o seu amor escorria pelo seu corpo, como suas lágrimas. Olhou para o lado, lançou a mão sobre um canivete, aproximou-o de seu pescoço...
Silêncio, tudo está escuro, ela está mergulhando pelas águas, ainda de olhos fechados, inconsciente.


- Oi, meu bem, meu bem! Acho que você dormiu demais hoje, a missa é daqui a 20 minutos. Você não vem?


Ela abriu os olhos vagarosamente, ficou olhando, não conseguia dizer nada. Olhou em volta, tocou seu companheiro.

- É... tá tudo ok?

Ela apenas balançou a cabeça positivamente e sorriu. Depois o puxou para a cama. Não queria fazer nada, queria ficar ali, coladinha ao homem que amava até que aquele domingo passasse logo, e depois, faria do resto da semana os seus domingos. E a cada vez que os laços se tornassem mais fortes, mais livres ele se sentiriam. Estava serena quanto a sua escolha, sabia que depois de algum tempo eles brigariam (como sempre ocorria), mas não queria esperar mais 6 dias para perceber que o amava. Agora ela o veria brilhar em cada gesto, quando cansasse, pintaria seu rosto de várias outras cores. Porque seus olhos podiam colorir o mundo. E, quando ocorresse, que fossem as brigas as provas de que o amor prevalece e não a morte.

2 comentários:

  1. Ah céus.
    Você se supera sempre,mesmo.

    Meu deus *-*

    Liiindo!

    ResponderExcluir
  2. Foi so um pesadelo...
    aqueles que vem pra gente ve o que precisamos concertar

    Por quanto tempo os pesadelos no atormentam??

    aiai
    acho que so vc msm pra entender

    ResponderExcluir

Coerentes na incoerência, ou não.
Seja como for, opiniões serão sempre bem-lidas.