sábado, 22 de maio de 2010

Cerne

Abri o armário do banheiro
e não vi sua escova de dente.
Seu cheiro não enche mais meu quarto.
Bati com a cabeça no granito frio
em que você costumava repousar seus braços
enquanto enfeitava o dia que estava por vir.

Corri para a cama,
talvez o travesseiro se abrisse
para que eu pudesse entender
o que está acontecendo aqui na superfície.
Mas eu não quero o gesto usual
das mãos que se apertam
no início de cada dia.
Eu quero os olhares cúmplices
do crime que é roubar o calor do seme-lhante.

Comecei a compreender...
Vi você despir sua alma
antes de ter de tirar suas vestes do guarda-roupas.
E hoje eu sentei na beirada da tarde,
até ver o novo dia nascer.

Olha só a ousadia do silêncio
dos primeiros raios de sol
surgindo por entre os fios de cabelo!
Veja o sonho inquieto das árvores querendo balançar
com o vento da manhã!
Qualquer burburinho
é a calmaria lá no fundo
gritando que é preciso sorrir.

Não importa quantas primaveras deixaram de florir
o importante é o que fazer com as sementes no inverno.
O sol vai esquentando envergonhado
e um friozinho ainda arrepia a pele.
Você não está sentado ao meu lado
mas não me deixa sentir frio
porque não está na superfície...
está dentro de mim.

sábado, 8 de maio de 2010

O jogo das cores


Descobriu que se abre por dentro,
escancarou a porta,
deixou sair sua luz
e quis ver a cor que vinha dele.
Não era azul...
Ele era como opala,
mudava sempre
de acordo com a forma que se olhava.
Ela não procurou o foco.
Gostava de bailar os olhos sobre as cores
É que ele também acontecia por difração.
Sempre contornando obstáculos
para se deixar colorir.
Ela chamou de jogo-das-cores
ou vida,
como preferir.


ps: às vezes a opala precisa de um polimento pra voltar a brilhar como antes.

sábado, 1 de maio de 2010

Só com o que for eu

A porta da saída tá aberta
mas você insiste em ir embora pela entrada
e bater a porta sobre os meus pés.
A dor corre pra janela emperrada
mas eu já conheço o caminho
que tenho que fazer de volta pra incoerência
só da alma.
só minha.
só eu
só.

Ainda não escolhi a estrada,
mas vou descalça e nua
por onde couber meus pensamentos e sol.
Eu não sei o quanto tem de espaço no infinito,
mas eu tô mergulhando dentro do labirinto que sou
pra não sair.

É que às vezes eu precisei não me respirar
e pulei pra fora.
Mas o ar de lá é denso demais,
tem gosto de asfalto
e só é ponte.

Eu prefiro ir nadando pelos extremos
e ficar só com o que for eu.
Mas... olha, aqui venta forte e faz frio
eu não quero te deixar no meio da minha tempestade
porque eu sempre faço chuva ao final do dia
mas se quiser esperar
amanhã o sol nasce
e esquenta a terra molhada
fazendo nascer o que plantou.